Psicóloga /Especialista em Gestão do Conhecimento
Tal como não há verdades absolutas.”
Nietzsche
Esse caso específico de mudanças no modo de trabalhar, apresenta uma complexidade peculiar, pois as mudanças, além de profundas são de âmbito internacional, fato que aponta para impactos em diversas áreas como: diversidade cultural dos inúmeros países, diversidade nas políticas públicas que regulam o trabalho nesses países, diversidade de fusos horários em países que eventualmente uma empresa mantém seus colaboradores, diversidade religiosa e outras diversidades que, ao longo do tempo surgirão e que provavelmente demandarão equalizações.
Vislumbrando esse cenário, é possível considerar a frase de autoria do George Bernard Shaw que diz - “Alguns homens veem as coisas como são, e dizem ‘por que’? Eu sonho com as coisas que nunca foram e digo ‘Por que não’?”. Grande parte da sociedade empresarial, já entendeu que os argumentos que impulsionam essas mudanças são fortemente convincentes. O tempo e os acontecimentos se encarregarão de nos dizer isso mais claramente. No momento, há algumas situações indesejáveis vivenciadas por empresas que já optaram em trabalhar no formato WFA, são elas:
- Quais métricas serão adotadas para medir o desempenho e o engajamento dos colaboradores que trabalham em ambiente físico diferente dos seus líderes?
- Como serão realizadas as reuniões que necessitam de um brainstorming?
- Como realizar reuniões práticas para resolução de problemas em grupo?
- Como avaliar se a ética e a moral estão sendo respeitadas?
- Como serão realizados os treinamentos on the job?
Algumas dessas questões relacionadas podem ter a eficácia comprometida, porém já existem soluções que, podem não atender 100% dos casos, mas apoiam as empresas WFA na realização da comunicação, do brainstorming e nas reuniões de resoluções de problemas. Sobre estas questões, o Prithwiraj (Raj) Choudhury (2020) diz o seguinte:
Quando os trabalhadores são distribuídos, a comunicação síncrona se torna mais difícil. Ferramentas como Zoom, Skipe, Microsoft Teams e Google Hangouts podem ajudar para aqueles que trabalham no mesmo fuso horário ou em fusos horários semelhantes, mas não para aqueles mais distantes. (...) As organizações WFA devem, portanto, se familiarizar com a comunicação assíncrona, seja por meio de um canal do Slack, um portal intracompany personalizado ou até mesmo um documento do Google compartilhado no qual membros da equipe geograficamente distribuídos escrevem suas perguntas e comentários e confiam que outros membros da equipe em fusos horários distantes irão responder na primeira oportunidade. |
Esse novo contexto tem demandado e demandará uma vasta criação de soluções nos diversos aspectos da gestão organizacional e, na gestão do conhecimento, várias práticas que ao longo do tempo veem se mostrando necessárias às organizações, algumas passarão ser fundamentais. Neste artigo vamos abordar a necessidade de uma dessas práticas, que trata-se da criação, registro e incorporação mental dos códigos deontológicos dos diversos grupos de profissionais existentes numa organização.
Considerando a subjetividade humana, as inúmeras diversidades de países em que encontram-se as pessoas de uma mesma empresa, a variedade de processos envolvidos nos trabalhos executados, a variedade de recursos associados à comunicação entre as pessoas na organização WFA, é fundamental que a Ética, a Moral e os Códigos deontológicos estejam definidos, descritos e incorporados nos atos de cada trabalhador. A título de conhecimento, estão apresentados, na (figura 2) os conceitos básicos para o entendimento desse conjunto de instrumentos que, se bem implantados, poderão amparar a gestão da nova forma de trabalho, bem como possibilitar uma maior previsibilidade nos resultados da empresa e, obviamente, viabilizar um relacionamento fluido entre empresa, líderes, liderados e pares.
Numa eventual migração do modo de trabalho presencial para o formato WFA, da mesma forma que poderá haver investimentos na transformação digital dos processos, poderá haver também uma remodelagem desses mesmos processos, com a intenção de readequar as rotinas de trabalho, estratégicos e operacionais. É justamente nesta fase que se recomenda que os códigos deontológicos sejam revistos, reescritos e reincorporados nas diversas normas e regulamentos que norteiam e orientam seus colaboradores para lidarem com dados e informações da empresa ou dos clientes, sejam confidenciais ou não. São os códigos deontológicos que devem também orientar os colaboradores a agirem de maneira assertiva, de acordo com a sua função, nas situações críticas das suas rotinas.
Para a empresa, a inclusão dos códigos deontológicos nas rotinas dos colaboradores pode ser considerada uma ação desafiadora pois, ao mesmo tempo que necessita-se padronizar comportamentos previsíveis, é preciso, também em contrapartida considerar que esta padronização pode eventualmente tolher ações criativas do colaborador. Assim sendo, faz-se necessário que o diálogo entre as pessoas e as interações entre líderes e liderados sejam uma prática constante, afim de sempre alinhar o respeito aos códigos deontológicos às eventuais ações a serem adotadas nas oportunidades críticas.
Num formato de trabalho WFA, o colaborador comumente está só em seu posto de trabalho e nem sempre o seu líder ou os seus pares estão acessíveis para apoiá-lo numa escolha de um procedimento e/ou um comportamento imprevisível e emergencial. Caberá ao colaborador, então, adotar os códigos deontológicos para orientá-lo e respaldá-lo perante a decisão a ser tomada, assegurando que a ética e a moral da empresa estão sendo respeitadas. Para garantir que esta situação ocorra com sucesso, cada grupo de profissionais, de acordo com suas funções, responsabilidades e atividades devem, internalizar em sua mente, seus códigos deontológicos, a fim de nortear suas ações e atitudes situacionalmente.
As soluções tecnológicas podem garantir a segurança de dados e informações, mas as máquinas não pensam por si mesmas e todos sabemos que as atitudes humanas que interagem junto as mesmas, precisam ser fiéis aos princípios éticos da organização. Então faz-se necessário a atenção aos cuidados na disseminação destes princípios éticos para todos os colaboradores e, principalmente para os novos contratados. Os processos de ambientação de novos colaboradores devem ser baseados em treinamentos técnicos, administrativos e comportamentais. Nestes casos, os códigos deontológicos são também instrumentos de preparação para o ingresso de novos colaboradores na organização. Veja o que o Professor José Pastore que é presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Federação do Comércio de São Paulo, disse em uma entrevista sobre o momento em que o mundo do trabalho está vivendo:
“(...) é preciso estar preparado para adquirir coisas novas a cada segundo, a cada minuto e o tempo todo. Isso sugere, para o campo do trabalho, que as pessoas estejam aprendendo o tempo inteiro e, continuamente sendo educadas e reeducadas, qualificadas e requalificadas.” |
Elisabeth Vargas, como profissional de informação atuou em empresas do sistema PETROBRÁS por 15 anos, como especialista em Gestão do Conhecimento, desenvolveu projetos para implantação de melhorias em ambientes organizacionais e de aprendizagem. Atuou como Diretora de Administração da SBGC, gerente de conhecimento da Serasa Experian. Atua como consultora na área de Gestão do Conhecimento e, como Psicóloga, realiza atendimento clínico usando uma abordagem psicanalítica. No campo social, atuou como examinadora voluntária do Prêmio Qualidade Rio e realiza rodas de conversas com temas relacionados ao autodesenvolvimento.
Referências
CAROLINO, Gustavo Mateus. A deontologia como instrumento de amparo profissional na prática da aviação: precisamos falar sobre a ética. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 4, Ed. 12, Vol. 05, pp. 16-24. Dezembro de 2019. Disponível em:
https://www.nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-aeronauticas/deontologia-como-instrumento
CHOUDHRUY, Prithwiraj. Our work-from-anywhere future: Best practices for all-remote organizations. HBR – Harvard Business Review, nov. dec. 2020.
Disponível em: https://hbr.org/2020/11/our-work-from-anywhere-future
DEJOURS, Christophe: A loucura do trabalho; estudo de psicopatologia do trabalho. Tradução de Ana Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira. 5ª. Ed. Ampliada. São Paulo. Cortez – Oboré, 1992.
O FUTURO do trabalho depois do home office. Época Negócios, No. 171, jun./jul. 2021.
LAMOUNIER, Bolivar. Impacto da tecnologia nas relações de trabalho com José Pastore. 24.07.2019
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iH-EcAVGY80