Era uma vez uma empresa muito organizada e eficiente naquilo que fazia. Todos os procedimentos eram manualizados, e todas as equipes, bem treinadas. Os colaboradores conheciam e sabiam executar perfeitamente seu trabalho, no momento certo e na hora correta. Mesmo assim, a alta gerência da empresa estava preocupada. Percebeu que os resultados, embora ainda fossem bons, começavam a declinar, e que a empresa perdia gradativamente participação no mercado.
– Não entendo o que acontece. A empresa é tão organizada, tão eficiente, fazemos tudo tão bem, e mesmo assim estamos patinando. Alguma coisa está errada, mas não sei o que é.
– Talvez eu possa ajudá-lo a pensar – respondeu o amigo. Meu negócio não tem nada a ver com o seu, mas gostaria de lhe fazer uma visita. Faz tempo que não vou à sua empresa.
Agendaram para a semana seguinte. Logo pela manhã, após as boas vindas, o anfitrião começou a mostrar ao visitante todos os departamentos: produção, desenvolvimento, qualidade, logística, comercial, contábil. Conversaram com as pessoas chaves de cada setor. Logo após o almoço, ambos examinaram os principais demonstrativos de produção, vendas e finanças. Lá pelo meio da tarde, sentaram-se para conversar.
O visitante começou a expor suas impressões.
– Não sei se você vai entender o que vou dizer – começou ele. Acho que vocês aprenderam bem demais o seu trabalho. Precisam desaprender um pouco.
– Como assim, desaprender?
– Vamos ver... como é que eu posso explicar... vocês aprenderam tão bem, fazem tão bem, que não conseguem mudar.
– Hum... estou começando a entender. Prossiga.
– A impressão que me dá é que está havendo um descompasso. Veja... as coisas lá fora mudam muito rápido, mas vocês seguem trabalhando da mesma forma que faziam vinte ou trinta anos atrás. Sim, vocês evoluíram e modernizaram algumas coisas, mas o trabalho em si é o mesmo... mas será que é o mais adequado para os dias de hoje?
– Boa pergunta. Mas como é que a gente pode descobrir?
– Receita para isso não existe. A gente pode tentar de várias formas. Mas o fundamental é entender o que está mudando. Mudando onde, como, com quem, para quem, você vai me perguntar. Ok. Com o cliente, com o concorrente, com o fornecedor, com o consumidor... Tem mais. Com a tecnologia, com o modelo de negócio, com a distribuição... Com a cabeça das novas gerações. Com outros ramos de atividade. Com as tendências de outros países. E vou dizer mais. Você não dá conta de acompanhar tudo isso. Mas percebi uma coisa com a experiência. A nossa equipe sabe muito mais coisas do que a gente normalmente se dá conta.
O anfitrião entendeu o recado. Percebeu que precisava colocar em dúvida boa parte do que vinha funcionando até então e, principalmente, fazer circular novas ideias na organização. Descentralizou decisões, compartilhou as questões da empresa com sua equipe e permitiu que procedimentos, padrões e até mesmo linhas de produtos fossem colocados em discussão. Passou a buscar informações externas de interesse da empresa e incentivou outras pessoas a fazerem o mesmo. Foram instituídos intervalos durante os turnos de produção para que as pessoas pudessem conversar, e por vezes eram
propostos temas para as conversas, fossem eles diretamente relacionados com as operações ou não. Os chefes e dirigentes tomavam parte desses encontros ao lado das equipes operacionais, como participantes comuns. Vez ou outra, equipes de áreas distintas conversavam entre si. Levou algum tempo para o novo modelo ser plenamente aceito e engrenar, e no início não se viu nenhum impacto nos resultados. Mas aos poucos as mudanças começaram a aparecer. Surgiram inovações nos procedimentos, no modelo gerencial, no relacionamento com os clientes e, por fim, na própria linha de produtos. A empresa ganhou uma nova feição e passou a ser vista no mercado de forma muito mais positiva. Questionado sobre a revitalização da empresa pelos portais de negócios, o presidente explicou:
– Nosso segredo para voltar a crescer foi valorizar e fazer circular o conhecimento que estava dentro da casa, mas que sempre foi deixado de lado. Antes, pensávamos que os roteiros, manuais e normas eram tudo o que era necessário. Ainda bem que percebemos a tempo que as coisas não são assim.
*Esta narrativa faz parte do trabalho final de conclusão do Módulo 1 do Programa Essencial de Formação Executiva em GC.
Sobre o autor:
Flavio Patricio Doro tem 54 anos e é servidor público há dezesseis. É graduado em Psicologia, com especialização em Administração e em Ciência Política. Na iniciativa privada fez carreira na área de sistemas de informação e atuou também como analista de custos e orçamentos. É auditor fiscal desde 2003, e desde 2007 está na Receita Federal, onde atua na área de planejamento, gestão e projetos. Nas horas vagas dedica-se à leitura e à música.